16ͣ  Assembleia Geral do CODESRIA : Chamada para resumos e comunicações

4 a 8 de Dezembro de 2023

Dacar, Senegal

Tema: As Ciências Sociais e a “Pandemia” em África

O Conselho para o Desenvolvimento da Pesquisa em Ciências Sociais em África (CODESRIA) realizará a 16 ͣ Assembleia Geral em Dacar, Senegal, de 4 a 8 de Dezembro de 2023. O Conselho escolheu o tema “As Ciências Sociais e a Pandemia em África” para esta edição da sua Assembleia Geral trienal. A Assembleia traduz-se na combinação da conferência acadêmica com uma reunião de negócios, em que os membros do CODESRIA discutem, entre outras coisas, o desempenho do Conselho, e os que se encontram em “situação regular” elegem o novo Comité Executivo. Esta edição da Assembleia irá também coincidir com o Cinquentenário da fundação do Conselho.

A Assembleia chega num momento caraterizado por um contexto global de pandemia do COVID-19. A pandemia representa, para além do seu significado estritamente biomédico, um momento epistémico com implicações relevantes em termos da produção de conhecimento, quer em termos globais ou mais especificamente África. É um momento repleto de possibilidades para se pensar o sentido do trabalho acadêmico e de como os seus caminhos foram definidos e redefinidos a partir do esforço intelectual. É um momento em que a área das ciências sociais e humanas é objeto de” mudanças significativas em termos sociopolíticos e económicos. Não só as grandes potências estão a enfrentar sérios desafios económicos, como existe também um acerto de contas a ocorrer no campo político. A experiência democrática foi enfraquecida por uma reação agressiva (,) no cerne das democracias liberais. As realidades sociais e as consequências da pandemia do COVID-19, bem como as exigências fiscais impostas às economias, traduzem-se numa crise económica global e numa retaliação política contra a democracia em algumas partes do mundo, o que levanta questões importantes para as ciências sociais e humanas. Essas interrupções convidam a repensar as metodologias, a fim de compreender as rápidas mudanças sociais e se essas mudanças anunciam transformações sociais significativas.

No cerne do mito da origem da pandemia estão duas versões: a primeira, que o vírus surgiu como consequência não intencional de um processo de pesquisa mal sucedido, e a segunda, que foi deliberadamente fabricado por cientistas. Existe ainda uma terceira versão segundo a qual o vírus terá resultado do contágio do ser humano por uma espécie selvagem. O foco na origem do vírus, isto é, o momento do “pecado original”, por mais importante que seja, oferece pouco espaço para explorar os desafios fundamentais. Oculta um foco mais crítico na disseminação global e, mais importante para nós, o seu impacto em África. Pior ainda, a propagação do vírus ficou, ocasionalmente, refém de outra pandemia: a interminável contestação pela “verdade da questão”, rodeada de suposições e especulações não verificadas. Tais especulações influenciaram significativamente a narrativa posterior da pandemia, demarcaram seus contornos e impediram avanços no sentido do controlo e prevenção. Mesmo durante a proliferação da “pandemia” de “fake News”, algumas questões significativas e até desconfortáveis foram levantadas sobre histórias de pesquisas científicas não éticas, sobre as implicações da investigação científica das atrocidades em massa, e a exploração e abuso de populações. Paralelamente, existe a questão da Big Pharma que está aparentemente ligada ao impulso do superlucro dos desafios predominantes em termos médicos e de saúde. A produção de conhecimento com base na corrida para inventar curas e vacinas com a finalidade de entender as respostas da sociedade ao surto, justificou a busca por um “retorno ao normal”. Todas essas dinâmicas se deram num contexto de intensos debates sobre a autoridade da ciência e a legitimidade do produtor de conhecimento. Enquanto para alguns, os produtores de conhecimento carregam esperança em tempos de profundo desespero, para outros eles atraem o mundo para um caminho distópico.

Esta pandemia foi, portanto, marcada por perspectivas tentadoras em termos de reorganização do conhecimento. Os dilemas, incluindo o negacionismo pandémico, obrigaram a um reconhecimento do papel que as ciências sociais e humanas podem desempenhar na questão de dar sentido à dinâmica da pandemia, inclusive em saber como lidar com surtos de doenças e compreender a natureza multifacetada de sua propagação, mutação e efeitos. No entanto, as ciências sociais ainda são, frequentemente, percebidas como subsidiárias de STEM- áreas de estudos que só interessa invocar quando as ciências naturais e biológicas encontram obstáculos intransponíveis. Persiste a necessidade de entender a pandemia como uma realidade sociopolítica e não biomédica. Isso exige repensar a permanente compartimentalização dos campos de conhecimento e romper as fronteiras disciplinares através de estruturas interdisciplinares ou transdisciplinares.

A evolução da pandemia de COVID-19 em África, com números de casos e de mortes abaixo do esperado, intrigou o mundo. O semanário “The Economist”, por exemplo, expressando dúvidas sobre o número de mortos anunciados pelos países africanos, chegou à conclusão de que o número global estimado de mortes por COVID-19 era de, pelo menos, 2,1 a 3,8 vezes maior do que os números oficiais. As incertezas sobre o número global de mortes resultantes do COVID-19 e a multiplicidade de hipóteses levantadas para explicar o problema merecem ser exploradas. Ainda assim, sabemos o suficiente para argumentar que as expectativas de que a pandemia evoluiria em África de forma diferente daquela que, de fato, aconteceu, exige uma nova postura no sentido de questionar a reiterada representação académica e da esfera pública do continente como um lugar de carência, de desastre/tragédia, de incompetência e de desamparo. O resultado até então alcançado obriga a repensar a atual tendência de olhar para a pandemia a partir da lente da biomedicina, para pensar nela usando a metáfora da disrupção. Isso, por sua vez, introduziu uma nova forma de olhar para o futuro: em vez de um “regresso à normalidade”, a ênfase é colocada na mudança para um “novo normal”.

É o reconhecimento de que, na base da ruptura e descontinuidade que caracterizaram a pandemia em esferas profundamente íntimas e na esfera pública, reside a velha ingenuidade e os mecanismos de adaptação que as populações africanas têm usado com sucesso para lidar com problemas de saúde, sociais, políticos e ambientais. Fatores estruturais profundos como pobreza, desigualdade de género, xenofobia e abuso da autoridade do estado, não apenas em África, como também no resto do mundo, determinaram de forma significativa o curso da pandemia. Paralelamente, existem desigualdades sociais evidentes na distribuição das vacinas, o “apartheid da vacina”, lembrando às economias em desenvolvimento que elas estão por sua conta. Ainda pior foram os exemplos da duplicidade europeia que se manifestaram em questões sobre direitos de propriedade intelectual, do acesso ao tratamento e de distribuição de equipamentos para produzir vacinas e realizar testes.

Na maioria dos casos, a preferência em utilizar as estruturas locais africanas para montar kits produzidos no exterior ao invés de as usar como locais de produção, contribui para atrofiar, corroer ou minar a base produtiva das economias africanas, incluindo algumas como a África do Sul, com capacidade para lidar com este tipo de tarefas. Em última análise, essas experiências levantam a questão de até que ponto a pandemia alterou a dinâmica social em vez de reforçar estruturas e processos preexistentes. Ou a pandemia terá reformulado esses fatores estruturais sem que os pudesse previr? O que está em jogo é a capacidade dos estudiosos das ciências sociais e humanas para interrogar estruturas profundas e a sua capacidade de resistir a choques, bem como de tolerar, de disfarçar e até mesmo de beneficiar de solavancos.

Como momento epistémico, a pandemia representa um evento importante que ajuda a ler e questionar a evolução da pesquisa social. Muito se tem falado sobre a necessidade de estudos nas ciências sociais e humanas para provar a sua relevância, auxiliando as sociedades a restaurar o próprio futuro. A pandemia também apresenta uma excelente oportunidade para questionar as condições de possibilidade de trabalho nesses campos académicos em tempos de crise. Se resistirmos ao impulso de classificar a pandemia como um evento excecional e, em vez disso, optarmos por usá-la como uma lente para entender a vida em África (e no resto do mundo) como a negociação quase constante de uma miríade de crises (ambiental, financeira, económica, social e política), então o que poderia emergir seria um interessante questionamento sobre o futuro das ciências sociais e humanas.

No intuito explorar/fazer uso ciências sociais e humanas neste momento de transição, o CODESRIA convida a apresentar trabalhos que usem a pandemia como prisma para aprofundar a produção de conhecimento na área das ciências sociais e humanas em e sobre África; ou que empreguem as ciências sociais e humanas como estrutura para dar sentido à pandemia, focando-se sobretudo nas formas como processos e dinâmicas de longa duração são definidos, influenciados e se manifestam durante evento. Também convidamos a apresentar trabalhos que, para além de interpretar a noção de pandemia, se foquem na metáfora da pandemia como um estado de crise devastadora e de declínio, que muitas vezes caracterizou setores-chave da política e economia africanas, desde setores como a educação e saúde, a setores como as obras públicas e mineração, historicamente pouco regulamentados. Os conflitos que persistem em algumas regiões africanas refletem essa pandemia metafórica na qual os interesses locais e as suas ligações com as cadeias globais, perturbaram as comunidades, destruíram o meio ambiente, minaram os meios de subsistência e transformaram a vida das pessoas experiência de “pandemia esmagadora”.

O Conselho convida a apresentar trabalhos que vertam sobre os seguintes temas:

  1. Ciências Sociais e Humanas em tempos de crise
  2. Pandemia como metáfora de rupturas na sociedade
  3. História, epidemias e pandemias
  4. Recriando a experiência da pandemia
  5. Pandemia e interdisciplinaridade
  6. Perspetivas africanas sobre epidemias e pandemias
  7. Conhecimento, artes e epidemias
  8. Escrevendo sobre a pandemia
  9. Epidemias e desigualdades
  10. Estrutura, agência e evolução de epidemias
  11. A dimensão de género sobre epidemias e pandemias
  12. Pandemias, identidade e a questão da cidadania
  13. Doença, viagem e movimento
  14. Pandemias, trabalho e meios de subsistência em África
  15. Pandemias, epidemias e imperativos de transformação social
  16. Os outros contágios: além da biomédica
  17. Reflexões sobre idade e pandemias
  18. Pandemias na era digital
  19. Os média/mídia e a pandemia

Os/as interessados/as em participar na 16 ͣ Assembleia Geral, apresentando trabalhos ou como organizadores de painéis, são convidados a enviar resumos ou propostas de painéis até 22 de Abril de 2023. O Conselho entrará em contato com os autores dos resumos aprovados até 22 de Maio de 2023 e os textos finais deverão ser enviados até o dia 22 de Julho de 2023. O Conselho informará os candidatos aprovados até 06 de Setembro de 2023. Os resumos enviados não deverão exceder as 500 palavras e as propostas de painel não deverão exceder as 800 palavras. Cada autor/a deve indicar de forma clara o sub-tema no qual o resumo ou proposta estão integrados.

Todas as candidaturas devem ser submetidas através da página web https://16thgeneralassembly.codesria.org/16th-codesria-general-assembly/

    

Não serão aceites envios por e-mail.

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